Um dos bairros mais tradicionais de Viamão,
permanece intocado em sua mítica: muitas pessoas
e a maioria dos moradores não sabem que o nome
correto do local é Cecília e não
Santa Cecília, talvez por analogia à
Santa Isabel. Mas é raro encontrar um “ceciliense”
que saiba de onde vem o nome deste importante pólo
político e econômico que se destaca a
cada dia.
O nome é uma homenagem à Cecília
Scliar, esposa de Henrique Scliar, que por volta da
metade do século passado resolveu lotear seu
imóvel rural, dando início à
expansão urbana da região.
Judeu russo, Henrique Scliar fugira para o Brasil
diante das perseguições aos judeus na
Revolução Bolchevique de 1917. Radicado
em Porto Alegre, mantinha amizade com intelectuais
e políticos de esquerda e usava a chácara
para reunir e receber amigos.
Deste modo, a propriedade adquirida com um prêmio
da loteria, acabou servindo de abrigo para as “férias”
de Jorge Amado e Zélia Gattai, quando o escritor
era deputado federal pelo PC do B, na segunda metade
da década de 1940, fato registrado pela esposa
do escritor em seu livro “Um chapéu para
viagem”.
Naquela época, a chácara do “seu
Henrique” era apenas uma casa de campo aonde
amigos da família vinham passar o fim de semana.
Entre os hóspedes ilustres estavam Érico
Veríssimo, Vasco Prado, Dionélio Machado,
Lila Ripol, entre outros.
Moacyr
Scliar, um dos mais renomados escritores brasileiros,
apesar da pouca idade que tinha, lembra com carinho
de suas viagens à chácara do Tio Henrique:
“Pouca gente sabe, mas existe, em Viamão,
um lugar muito ligado à história da
cultura no RS. Trata-se da Vila Cecília. Nos
anos quarenta, esta região era uma chácara,
de propriedade do sr. Henrique Scliar.
Na chácara funcionava também um ateliê
do Carlos Scliar, grande artista já falecido,
filho do tio Henrique. Quando Carlos mudou-se para
o Rio de Janeiro resolveu desmontar o ateliê.
Fui ajudá-lo e lembro da quantidade de quadros
e desenhos que ele rasgou, por considerá-los”
superados “(hoje figurariam em qualquer museu).
Com o tempo, entretanto, não foi mais possível
manter a propriedade, e o tio Henrique teve de loteá-la.
Mas a lembrança permanece.”
Trecho do livro Um chapéu para viagem, de Zélia
Gattai, 1982:
“A chácara do seu Henrique não
tinha fruta de espécie alguma, mas era encantadora.
A casa rústica, construída numa pequena
elevação, dava sobre um bosque; ao lado,
antes de entrar na mata cerrada, havia uma piscina
natural, toda de pedras, transbordante de água
cristalina provinda de uma nascente...
Era começo de semana e passamos, os dois sozinhos,
dias inesquecíveis, deitados em redes sob os
arvoredos, banhando-nos na piscina, fugindo ao sufocante
calor do tórrido verão gaúcho.Uma
empregada nos servia, e, ao meio-dia em ponto, chegava
um carro trazendo-nos almoço e jantar e os
jornais. Tão próximos da cidade e, no
entanto, estávamos em plena selva, longe da
civilização...”